o desafio de desenhar com palavras..
hoje desafio-te a descrever, pintando com palavras, todo o rosto desta mulher.
no máximo com 200 palavras.
IMPORTANTE: publica o link deste post, para quem nos lê ter acesso a todas as histórias.
este desafio teve início a 1 de Fevereiro de 2021 e será deixado a vogar
pela blogosfera para todos os que lhe quiserem dar continuidade.
ATENÇÃO: AGORA OS DESAFIOS SÃO QUINZENAIS. DIA 1 E DIA 15 DE CADA MÊS.
O RETRATO POR A ALICE BARCELLOS
"Sente-se aqui, minha filha". A menina sentava-se, tentando ficar quieta para o retrato, o que não era fácil quando se tem dez anos. Do outro lado, a avó, compenetrada, afiava o lápis de ponta macia que escorregava bem no papel. Depois, levantava o lápis no ar, na vertical e na horizontal, como que a medir o rosto da modelo. Ela já havia feito isso com as filhas e o filho, o marido e, agora, eram os netos os escolhidos para ficarem eternizados na precisão dos seus traços.
Alice não compreendia como a avó conseguia transpor tão perfeitamente o desenho do seu rosto para o papel. Os olhos pequenos e brilhantes, as bochechas salientes, os lábios carnudos, o cabelo desalinhado, o pequeno sinal a meio do lado esquerdo da face. Ela queria também aprender a desenhar como a avó, até chegou a fazer algumas das suas aulas de pintura. Esforçou-se, mas não progrediu, encontrou mais alento nas palavras. Afinal, com elas também é possível desenhar belos retratos e pintar quadros cheios de vida. E não há nada melhor do que as palavras para contar as memórias que nos marcam para sempre.
Saudades daquele tempo, avó.
olhar cansado com esperança no horizonte. cabelo atado à pressa para mais um dia de trabalho. a máscara esconde um sorriso sempre presente, não importa o seu estado de espírito. sempre numa correria para os outros, mas num ritmo que para si descarrega a adrenalina.
só que os olhos não mentem, porque esses mesmo que esteja a esboçar um sorriso... com um olhar mais atento sente-se a profundidade que vai dentro daquele corpo. uma pessoa habituada a sorrir perante a sua dor.
uma mulher resiliente, a sorrir perante as olheiras de cansaço, a olhar para o horizonte perante as pedras no caminho. a lutar por si, expressando-se nas suas expressões faciais e corporais.
O retrato. Sem pé neste lago, eu não sinto este momento, aos poucos... Agora! E tu tentas desenhar-me como me imaginas. Eu ouço a música do rádio, mas o meu corpo está a descer. Quanto os nossos Amigos tentam falar sobre isso, eu digo que foi tudo em vão. Mas o meu coração é tão pequeno na tua cabeça. E todos estes sons... São quase uivos na tua cabeça, pois tu ignoras. Tu és jovem, és idiota. Sê uma luz!
O retrato. Tu achas que deves-me tratar como uma simples flor delicada. Tu tentas desenhar os jeitos do meu cabelo. Juro que está na minha hora. Mas tu não perdes a oportudades e tentas desenhar-me mais e mais. Tenta desenhar outra coisa que te faça sentir como se estivesses a dançar. Agora, meu querido, esquece-me. Eu estou perdida dentro deste lago. A água tapa a minha cabeça. Não tentes ser algum tipo de som. Algo está a correr mal. Agora sei que isto é provavelmente tarde demais para tentares pedir desculpa pelo teu erro, mas eu só te queria ver agora. Nunca mais me trates como se eu fosse uma simples flor delicada.
O retrato. Eu espero ficar para sempre na tua mente. Repara bem, está na hora. Eu sei que tu e todas as pessoas vão-se recordar de mim de forma tão exagerada para ser real. Tu defines o modo como desço aos poucos. Eu já estava à espera. Eu já estava à espera. Eu já estava à espera.
O retrato. Toda a gente se perde no que está a fazer. Tu paraste de me tentares desenhar. Achas que já não vale a pena. Tu só falavas em amor, amor, amor, amor. Eu já estava cansada. Como era possível estavas tão apaixonado? Estavas fascinado, talvez. Não, não digas isso. Deixa-me ir. Deixa-me ficar apenas como estou nesse desenho. Inacabada. Agora não passo dum...
Retrato.
Retrato.
Retrato.
O RETRATO POR O CRISTÓVÃO NOGUEIRA
Quantas vezes me perdi nos seus olhos.
Aqueles olhos pequenos e semicerrados,
que buscam mais do que está à vista
e neles, os meus ficam encarcerados!
Seus cabelos longos e lisos.
Mesmo presos se revoltam.
Em mim se apodera a vontade de lhes acariciar.
Num instante as minhas intenções se denotam.
Nariz, queixo e boca numa impecável harmonia.
Airosa, de beleza distinta!
Seus lábios… Ah, os seus lábios vermelhos.
Mostra o poder de uma mulher nos seus trinta.
Lábios que me convidam a um beijo sem fim.
Lábios delicados cuja existência é um pecado.
Mulher cujo perfil me tira o fôlego.
Por ele estou completamente enamorado.
O RETRATO POR A MARIA DA VEIGA
Aqueles grandes olhos castanhos sempre fitavam o mundo num misto de esperança e nervosismo.
O nariz perfeito, os lábios carnudos e aquele sinal ao canto da boca...
O pescoço adornado com o seu pendente preferido.
Em frente ao toucador, de costas para ele, evitando o choro para não estragar aquela noite mágica.
Ela, procurando coragem para desligar os pensamentos que a atormentavam, olhou-se ao espelho. Viu tristeza nos seus próprios olhos e não gostou. Tentou sorrir, aos poucos...
Quando se juntou a ele na cama, trocaram olhares e carinhos.
Ele, assoberbado com a beleza daquela mulher enigmática.
Ela, feliz por encontrar abrigo e cura para seus tormentos naquele abraço forte.
O incisivo meio torto só aparece nos dias bons; quando as gargalhadas fogem pelo nariz à socapa e lhe arregalam as ventas por uns segundos.
Mas o constrangimento rapidamente lhe leva o sorriso dos lábios e a mão à boca. A mesma mão que constantemente esconde o pelo que cresce no sinal do queixo e que só ela vê.
As bochechas, habitualmente rosadas, pintam-se de vermelho, num padrão que faz lembrar uma aguarela a nascer numa folha de papel virgem, depois de delicadamente tocada pelas cerdas de um pincel molhado.
Os seus olhos crescem, instantes antes de encontrarem o chão, para não mais o abandonar.
E o momento esvai-se, deixando apenas uma memória ténue de um rosto perfeito nas suas imperfeições.
Tens um olhar firme, decidido, daqueles que não engana. Nem se verga!
Apanhaste o cabelo numa trança mal-alinhavada e deixaste que alguns cabelos tombassem de lado.
Posso imaginar na ausência alva um sorriso ou uma dúvida nessa face sem cor. Tivesses máscara cirúrgica…
A testa alta denuncia inteligência, as sobrancelhas tenacidade.
Falta o nariz que poderia ser aquilino ou quiçá helénico. Mas também adunco…
Nada retiraria a beleza desse olhar.
Longínquo. Penetrante. Sagaz.
Feminina!
o retrato por João-Afonso Machado excede
as 200 palavras, mas está AQUI para nosso puro deleite.o João-Afonso Machado teve a cortesia de reduzir o seu texto
para 200 palavras (as duas versões são preciosas) ei-lo:Um nariz assim, tão proporcionado!... Nunca comprido em excesso ou curtinho, amedrontado. Nele convergiam os olhares do autocarro, senhora ainda de um olhar enorme, como ovos azulados, pestanudo, sem as obsessões das damas com o tamanho das sobrancelhas.
O cabelo caía-lhe no pescoço despretensiosamente. Castanho, sem tinta. E as faces mantinham a maciez, uma pele limpa como um godo nas águas correntes. No mais…
… A sua boca era perfeita e continuava sem acessórios. Os dentes, marfim imaculado. E depois o queixo, com uma covinha carinhosa, tudo era equilíbrio até ao pescoço, bem erguido e alto….
… A sua figura negligé corresponderia à sua normal atitude perante a vida que lhe acrescentava mistério. Arrumou um resto de madeixa de cabelo em orelha linda, sem brincos, um sorriso o mais simples, como a sua vestimenta …
…A sua imagem ficou no desgosto de a ver descer do autocarro. Haveria outro dia?
Haveria outro dia para aquela boca tão singela, sensual? Para um queixo de futura mãe. Para tão saudáveis feições, no lugar da mais perfeita estátua do classicismo antigo?
Numa qualquer esplanada… os meus dedos deslizariam entre os meandros da sua face, prometendo-lhe o mundo inteiro de ser feliz.
O RETRATO POR A OLGA CARDOSO PINTO
Vi-o num espelho refletido, sem saber quem era. Esse rosto desconhecido, elegante, belo, no entanto, incompleto, esbatido sem deixar entrever o nariz e a boca, nem o remate do queixo. Cada vez que me mirava nesse velho espelho, eras tu que via. Admirada por tal visão quis saber quem eras. Mais ninguém te divisava, duvidei da minha sanidade. Por seres a aparição no espelho de família, esquecido no empoeirado sótão e resgatado graças ao meu constante deambular pela casa adormecida, presumi que foras alguém do meu passado. Uma avó, uma tia? Quem?
Vasculhei nas antigas caixas feitas de metal da bisavó. Inúmeras fotografias retratavam passeios, entes queridos nascidos e falecidos há muito. Paisagens coloridas a pincel. Mas a ti não te via retratada nas películas amarelecidas, no sépia que invadia a mesa e a minha mente.
Voltei aos álbuns, às fotografias espalhadas. Já tentada a desistir nesta procura que se assemelhava a loucura, levantei os olhos e sobre o aparador lá estava a fotografia desbotada de uma mulher sentada, em pose de fotógrafo de estúdio. Retoquei o teu lindo rosto, definindo-o a aguarela. Contornei o nariz fino, depois os lábios e finalmente o contorno do teu belo rosto sem nome.
O tempo
O tempo passou
Ela olha para o espelho
E vê que tudo mudou
Aquele rosto
Em tempos risonho
Já não sabe sorrir
Tem um semblante tristonho
As rugas
Vão chegando
Naquele rosto cansado
Talvez culpa da vida
Talvez culpa do fado
A imagem esfumava-se, e ele não queria esquecer, não podia, o que isso diria da sua pessoa?
Fez um esforço de memória para relembrar os olhos doces cor de amêndoa, os lábios cheios de formato perfeito, as covinhas que apareciam nas faces sempre que sorria, o nariz adunco e muito direito, mas também apareciam as lembranças das rugas dos últimos anos.
Quando os olhos perderam o brilho, mas nunca a cor, quando as faces encovaram e a pele perdeu o viço e a firmeza. Quando a doença lhe vergou os labios num sorriso tão triste que doía.
Talvez por isso tinha momentos em que não conseguia recordar o seu rosto, porque não queria recordar os últimos tempos, a transformação a que foi sujeita pela dor e pelo sofrimento.
Talvez fosse melhor assim...
O sol ía alto, projetando nos seus olhos a sombra, mas não lhes retirando luz.Olhos a descoberto pelo cabelo, junto num apanhado que ameaçava já desmanchar-se e invadir o rosto.Um gesto rápido o afastaria e os olhos continuariam, vastos, dizendo o que precisava ser dito.Disseram e desviaram-se, já ignorantes d'Ele, fixando um ponto no infinito, onde vagueava o pensamento d'Ela.Ele continuou fixo naqueles olhos. Veio-lhe à ideia a maneira como se semicerravam quando o nariz, um pouco grande para o rosto aspirava o ar forte da maré vazia. Um nariz aquilino, de uma beleza que provocava os cânones.Os olhos, evitando agora os seus, continuariam a semicerrar-se nas gargalhadas, soltas por aquela boca não muito bonita, com um lábio inferior polposo e um superior contraditório, fino como uma linha.Toda aquela mulher era um território incoerente, maravilhoso e apaixonante. Mas para Ele, era altura de rumar a outras paragens...
A jovem mãe na casa dos trinta anos tinha uma fresca pele levemente morena, um forte cabelo castanho com caracóis largos indomáveis que usava penteados para trás, num enrolado na nuca, entre um nó e um carrapito. O rosto oval, de contorno doce e meigo como o sorriso que habitualmente tinha. Lábios delicados e carnudos muito desenhados, ladeados por vincos de quem ri e sorri com vontade. As bochechas levantadas de tom levemente rosado eram a base de um olhar límpido de grandes olhos esverdeados e pestanudos. As ligeiras olheiras eram parte das marcas da maternidade recente, mas não retiravam beleza ao conjunto encimado por sobrancelhas grossas, muito bem arqueadas e com o mesmo ar indomável. algo rebelde, que também tinham os cabelos. O seu pescoço elegante e bem definido completava aquela face de beleza natural, serena, cheia de vida, e ao mesmo tempo complexa e plena de distinção.
O RETRATO POR ANA DE DEUS
o rosto vem coberto por um véu
mas eu conheço-lhe as linhas de cor
a minha amada tem olhos sorridentes
pincelados por longas pestanas
um nariz arrebitado delineado a traço firme
os lábios carmim são um primor
apaixonei-me pela serenidade do perfil
encantei-me pela perfeição do rosto oval
o olhar profundo cativa-nos mais do que tudo
na ausência do véu será a minha mulher